MEUS ESCRITOS

Às vezes ocorre um surto de inspiração e eu não resisto. Aqui vão algumas coisas que escrevo.

 

POETANDO
RIO BRASILEIRO
MENINA, EU TE AMO!
O SUJEITO NO ELEVADOR
A FOTOGRAFIA
OS ÓCULOS
PAIÊ... EU TÔ ESCREVENDO PRO JORNAL!!!
EXCLUSIVO
UM BEIJO NO PESCOÇO...
VOLTAR?

 

 

 

POETANDO

Elio R Anderson

Um dia destes, menina, eu estava poetando,

poetei uns versos lindos, e então fiquei recitando.

 

Os versos falavam das flores, (aquelas que você tem)

e comparavam as flores, menina, você adivinha com quem?

 

Comparavam teus lábios à rosa, menina, e o teu rosto ao jasmim.

(Se você lesse estes versos, você corria para mim)

 

Mesmo não sendo poeta, eu me pego a poetar,

pois todo homem poeta, menina, quando começa a amar.

 

Você também tem poetado, menina, poesias só para mim.

(Poemas são tuas palavras... teus beijos... você, enfim)

 

Você me poeta e eu te poeto sobre todos os assuntos.

O amor e a poesia farão, menina, que estejamos sempre juntos.

 

E juntos poetaremos, menina, da noitinha ao amanhecer.

E ensinaremos poesias, para o filho que nos nascer.

 

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RIO BRASILEIRO

Elio R Anderson

 

Rio Tinguá...

 

Rio bonito, rio querido!

Até peixes coloridos

existem para te enfeitar.

Você nunca causa enchente

para não molestar a gente

da casa do Coronel.

 

Rio Tinguá...

 

Rio perene, rio valente!

Nem mesmo a seca mais brava

é capaz de te secar.

Dessa forma, te aproveitam,

dia-a-dia, o ano inteiro

na casa do Coronel.

 

Rio Tinguá...

 

Rio querido, de água limpa

que serve para fazer a comida

e serve para refrescar.

Tua água é tão gostosa

que dá vida nova às rosas

da casa do Coronel.

 

Rio Tinguá...

 

Rio maneiro, sossegado,

onde pode brincar, sem cuidado,

a filha do Coronel.

Te olhando, me pego a pensar

que seria quase o céu

se todo rio fosse Tinguá

e todo homem um coronel.

 

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MENINA, EU TE AMO!

Elio R Anderson

 

Falando, ou andando, ou parado, ou calado,

estou sempre pensando, estou sempre lembrando

que estás ao meu lado.

 

E assim, vou vivendo

a felicidade

de saber que te tenho!

 

Por saber que te tenho,

para sempre, ao meu lado

já não me preocupo, já não me entristeço,

pois eu sei que te tenho!

 

Se estás sempre ao meu lado,

e eu, ao teu lado,

seremos felizes

 

E, andando, ou falando, ou parado,

(até mesmo calado !)

estou sempre dizendo:

Menina, eu te amo !

 

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O SUJEITO NO ELEVADOR

Elio R. Anderson - Abril/97

        Dia desses, a caneta na mão, os óculos no bolso, precisei subir à Divisão de Contabilidade, no quinto andar do Paço Municipal, e para tanto, entrei no elevador (aquele elevador novo, muito lento, exageradamente lento, todo em inox, com lâmpadas fluorescentes nas laterais, etc. etc.). Apertei o botão correspondente e, ao olhar para traz, vi um sujeito, me pareceu simpático, e cumprimentei-o cordialmente com um bom dia, e perguntei, com toda delicadeza, em que andar ele iria, para que eu pudesse marcar no painel, mas o sujeito nada respondeu.

        Resolvi me calar, pois é um direito do contribuinte entrar no elevador e também é um direito constitucional, o de ir-e-vir, com liberdade, mas achei estranha aquela atitude.

        Passei a prestar atenção naquele sujeito. Definitivamente, embora aparentasse, ele não era muito simpático. Eu o olhava e ele me olhava; eu olhava para outro lado e ele fazia o mesmo.

        Me calei e deixei seguir, mas estava preocupado enquanto o elevador subia. Passou pelo primeiro... pelo segundo..., e tudo continuava na mesma. Comecei a assobiar, me cocei, passei as mãos pelo cabelo, impaciente, e o sujeito nem para me dizer alguma coisa.

        Comentei sobre o tempo (ô coisa boa para iniciar uma conversinha criativa!!!) e ele não respondeu. O elevador subindo... sempre subindo... naquela velocidade horrível, de poucos metros por minuto. Parecia que já fazia tempo demais que estávamos lá dentro!

        Daí eu decidi; não era nada bonito o que eu ia fazer, mas eu já estava decidido. Quando o elevador parasse no quinto andar, o sujeito teria que descer, então eu sairia antes dele, o encararia e me apresentaria, pois estava deveras curioso, afinal, ele podia ser um surdo-mudo, um estrangeiro que não conhecesse nossa língua, ou talvez, alguém que estivesse fugindo da polícia da Grande São Paulo (anda dando medo, esses policiais de Diadema). Também poderia ser um assaltante, pois a Tesouraria fica também no quinto andar. Talvez até fosse algum seqüestrador que tivesse vindo para sequestrar o Reinaldo, presidente da Associação, afim de conseguir, como resgate, um desconto na mensalidade da Unimed.

        Ao chegar-mos, enfim ao quinto andar, antes que as portas do elevador se abrissem, coloquei os óculos, virei-me para o sujeito e caí na gargalhada . . .

        Aquele sujeito era, simplesmente, o meu reflexo, no espelho!

 

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A FOTOGRAFIA

Élio R. Anderson

        Dia desses, no escritório, cansado, devido ao excesso de trabalho aliado aos poucos dias de férias nos últimos quinze anos, além das dificuldades financeiras por que a empresa vem passando, aconteceu de, ao olhar para a parede atrás da minha mesa, ver um buraco.

        Não era um buraco muito grande, mas era bastante profundo. Dava a impressão de que alguém, não sei se da limpeza ou da manutenção, tirara daquela parede um prego grande, ou um pequeno parafuso com a respectiva bucha.

        Não sei quando isso possa ter ocorrido, desde quando aquele buraco lá estava, servindo, talvez, de esconderijo para insetos, além de enfeiar a parede. Fazia tão pouco tempo que havíamos mandado reformar e pintar o prédio... Aquele buraco, definitivamente, não deveria estar ali!

        Apertei o botão do interfone, chamando a secretária, que andava revoltada comigo por ter recebido apenas 5% de reajuste salarial há dezoito meses, e, quando ela entrou em minha sala, mostrei-lhe o buraco da parede e perguntei, zangado, se ela não tinha visto aquilo antes e, caso tivesse, porquê não havia providenciado o conserto. Seria possível uma coisa dessas? Um homem atarefado como eu ter que cuidar de “detalhezinhos”, que já não podia contar com funcionários eficientes, etc., etc., etc. ... Onde mais se veria isso?, explodi!

        Dona Conceição (minha secretária), começou a chorar (e ela já sabia há muito que eu não suportava lágrimas), e chorar alto.

        Lembrou que aqueles 5% que eu havia dado era menor do que a inflação, à época, e que nos últimos meses o custo de vida havia subido muito, mesmo com o Plano Real do FHC tendo dado certo, e que ela precisava de, no mínimo, 30% de reajuste salarial, além dos demais benefícios. Continuou tentando argumentar, pois sabia que eu tinha um “coração mole” e não seria difícil me “dobrar”.

        Irritado, naquele momento, em que já iria abrandar minha voz, me vi gritando que ela parasse com aquilo, que no próximo mês eu negociaria com o sindicato, mas que, naquele momento eu falava “daquela brecha” na parede. (Não, caro leitor, o buraco não havia aumentado com os gritos. Ele permanecia do mesmo tamanho e no mesmo lugar! Eu é que fiz aquele estardalhaço para que ela parasse). - “Se a Senhora já não pode se ocupar com detalhes do meu escritório”...

        Dona “Ceiça”, (apelido carinhoso de Dª. Conceição) saiu de minha sala sem dizer mais nada. Percebi que eu havia exagerado na bronca. Talvez aquele buraco tivesse surgido há poucos minutos, ou ontem, ou... Sei lá! Ela sempre fora muito dedicada. Talvez até já tivesse providenciado para que fosse consertado depois de minha saída do escritório, pois eu não suportava poeira.

        Cansado de tudo e de todos, envergonhado do tratamento que dera à minha dedicada servidora, pensei em suavizar a situação, e acabei por fazer o que sempre soube que não deveria: tentei contemporizar, falando de assuntos relacionados ao serviço, pedindo sugestões a respeito de contratos, etc., etc., e tentei brincar, comentando que aquele buraquinho na parede (não, caro leitor... o buraco não mudara de tamanho; eu é que achei que deveria minimizar aquilo tudo!). poderia ser coberto com um quadro bonito, ou com uma foto de minha família... Ela que decidisse... Ela sempre tivera muito bom gosto, eu confiava nisso...

        - “Fica a seu critério, Dona Conceição! Amanhã estarei viajando e vou tranquilo, pois sei que a Senhora cuidará disso por mim”.

        Pobre de mim. Eu não devia ter feito aquilo...

        Primeiro, deixar minha secretária nervosa, brigar com ela, até; depois, dar-lhe carta branca para tapar aquele buraquinho na parede, que fora a causa de toda a briga. Agora eu não poderia de forma alguma reclamar da solução dada

        De volta da viagem, ao entrar no meu escritório, pasmei !!! Na parede atrás da minha mesa, em lugar de destaque, estava a foto de minha sogra, abraçada à secretária.

 

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OS ÓCULOS

Elio R Anderson

       Desde criança, criança pequena, eu digo, sou um apaixonado por óculos.

       Eu via os idosos usando óculos e achava o máximo.

       E meu avô, então . . . ?

       Imaginem: ele tinha um óculo, isso mesmo, no singular. Era um aro de ouro, ou prata, já nem lembro, com uma lente, que era preso a uma corrente. Ele ficava no bolsinho do paletó, o óculo é claro, minha senhora, que meu avô sempre usava paletó! e, quando necessário era colocado no “olho de ver”, o que permitia que meu digníssimo e lindo avô lesse todas as notícias e documentos, enxergasse todas as fotografias, contasse o dinheiro, cédula por cédula, etc., etc., etc.

       Servia ainda para disfarçar, eu acho, pois quando alguém fazia uma pergunta embaraçosa, meu avozinho tirava o óculo do bolsinho e ficava limpando, limpando, limpando . . .

       Eu olhava as crianças, os adolescentes, os jovens, os adultos que usavam óculos e achava lindo. Só não conseguia entender para quê servia aquilo, pois quando eu colocava nos olhos não enxergava nada direito. Mesmo assim eu queria um.

       Outra coisa que me atraia, nos óculos, era aquela mágica: Você concentrava a luz do sol sobre um papel, ou pedaço de madeira, ou um bichinho, e via sair uma fumacinha, que às vezes chegava à chama. Quando eu focalizava no braço da minha irmãzinha, nem chegava a sair fumaça e ela já saia correndo e chorando. (Minha irmãzinha, sim, minha Senhora; Naquela época eu não tinha sogra, ainda!)

       Um dia, ainda me lembro desse dia, meu irmão, um pouco mais velho que eu, teve a idéia: Porque não usar a armação sem lentes ?

       Gostei !

       Fui à gaveta-do-meio-do-guarda-roupas-de-minha-avó, peguei uma armação velha, já aposentada, e tirei as lentes. Um gênio, o meu irmão.

       Eu usava a armação e me sentia bonito, enxergava tudo perfeitamente e ainda podia coçar os olhos ou andar na chuva, sem precisar tirar os óculos.

       Lindo!, até eu perceber o ridículo daquilo.

       Então decidi comprar meus próprios óculos e, após juntar um dinheirinho, ganho com a venda de “tampinhas de garrafas de leite”, comprei uns óculos de sol.

       Tinha um inconveniente, ainda. Eu não podia usá-lo durante a noite, ou dentro de casa, ou no cinema, mas, fora isso, . . .

       Hoje, já homem maduro, eu percebo a bobagem que eu fazia em gostar de óculos.

       Minha vista enfraqueceu, por isso passei a usar óculos de leitura, na ponta do nariz, que me serviu a contento até piorar um pouco. Daí, precisei de óculos bifocais. Hoje eu tenho os óculos para perto, para longe, de sol, o bifocal, de dois anos atrás, multifocal, deste ano e: acreditem, uma lupa, para quando preciso enxergar direito.

       Além desses, um amigo meu insiste em dizer que eu tenho também os óculos para procurar os óculos.

       Bons tempos, aqueles, do meu avô !

 

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PAIÊ... EU TÔ ESCREVENDO PRO JORNAL!!!

Elio R Anderson - Março/97

       Lembra, paizão, quando eu morava aí, na Capital? Ninguém diria que um dia eu conseguiria escrever alguma coisa, mas o Sr pode ver, eu tô aqui, escrevendo, ou melhor, di-gi-tan-do!

       EU ESTOU DIGITANDO NUM COMPUTADOR DE VERDADE, pai. Parece brincadeira, né?

       Pois é, paizão... O vovô dizia, a vovó concordava... mamãe repetia sempre, as titias, idem! Até as vizinhas sabiam isso: O seu filho prometia, pai! Aquele menino prometia; Alguns talvez não vissem isso, mas aquele menino prometia...

       Ele bagunçava para valer. Jogava bola, rodava pião apostando, e quase nunca perdia. Soltava pipas, fazia balões, roubava frutas nas diversas chácaras... Caqui, manga, jabuticaba, pitanga, amora, pêra, abacate... cada fruta a seu tempo, (e tinha tempo para tudo).

       Cabulava aulas para nadar na lagoa. Levava castigo, até apanhava, mas, lá ia ele, de novo, bagunçando, aprontando...

       Mas aquilo era coisa de criança, da infância, paizão. Depois, chegou a adolescência. Tempo besta, pai!

       Adolescência. Palavra bonita, né? Mas que só complica a vida da gente. Se o adolescente apronta, ele apanha, porque já não é criança. Se quer um dinheirinho para sair com a namorada, NADA! Ele ainda é criança para isso.

       Bagunçar não pode (VOCÊ JÁ É HOMEM). Chegar tarde não pode (VOCÊ É MUITO CRIANÇA...).

       Êh, tempo besta!

       Assim mesmo, o tempo passava; um calendário após o outro.

       Nasceu a barba (o bigode eu deixei!), e o tempo passando... Usei gravata para trabalhar, usei roupa cheia de graxa...

       EU ATÉ ME PERDI PELO MUNDO, pai, mas, DEUS É GRANDE!

       Já “meio velho” cheguei a Marília (CIDADE BONITA, MEU PAI...

...SÍMBOLO DE AMOR E LIBERDADE), e aqui me libertei, encontrei meu amor , me casei...

       Pois é, paizão! Hoje aqui estou eu, feito homem sério, (me chamam até de “Seu Élio”, meu pai.), escrevendo p’ro Jornal.

       Tá certo que é jornal pequeno. (mas, para começar, serve.)

       Tá certo que o redator é meu amigo, junto comigo. (mas, para começar, vale)

       Tá certo que o Jornal é da Associação, não é nenhum jornalzão comercial, mas serve... o que vale é que... EU TÔ ESCREVENDO P’RO JORNAL.

       PS: O nome do Jornal é “NÓ CEGO”, mas não tem nada a ver!

 

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EXCLUSIVO:

Elio, O Repórter Nó Cego, quando ia para a beira do rio com seu material de pesca. entrevista um ET que apareceu na madrugada de Marília, num encontro inesperado,

NÓ CEGO: Boa-noite, Sr. ET. Poderia nos dizer o seu nome?

ET: MMMFF...

NÓ CEGO: Quero dizer que é um prazer, e uma emoção muito grande, entrevistar um visitante extraterrestre, assim, eu gostaria de, em nome dos habitantes do meu planeta e também da ASPMM, dar-lhe as boas vindas e convidá-lo a tomar um cafezinho comigo. O Sr. aceita?

ET: MMMFF... HHH...

NÓ CEGO: (Tirando da sacola sua garrafa térmica e os copinhos): O café está sem açúcar, mas, se o Sr. preferir, eu posso arrumar adoçante!

ET: MMFFF... MMMFFF... HHHHHHH...

NÓ CEGO: Sr. ET, não precisa chutar o copinho! Se o Sr. não gosta de café, deixe que eu tomo! (Pausa para o café). De quê planeta o Sr. vem, Sr. ET?

ET: HHHHH... MMMHH... MMMMFFF... HHHH.....

NÓ CEGO: Calma, calma, caaalmaaa... Não fique nervoso! Eu já estou indo embora, mesmo... (Ô Etzinho bravo, sô!).

NR. Tão logo o Élio, o Repórter "Nó Cego" saiu de perto do ET e foi pescar, chegou uma viatura ao local, que desamarrou e desamordaçou o Sr. Joaquim, português gordo, que tinha sido assaltado no final da noite.

 

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UM BEIJO NO PESCOÇO...

Elio R Anderson - Julho/97

 

       Sábado, manhã de sol, as folhas respingando o orvalho daquela noite linda, as gotas filtrando os raios de sol, lançando iridescências ao redor. Em plena praça da matriz, às sete horas da manhã, cachorrinho a tiracolo, passeava eu, achando que aquele cãozinho “pequinês”, apesar do tamanho reduzido, era a maior “mala-sem-alça” que já havia cruzado, e atravancado, o meu caminho. Pudera... minha esposa o havia ganho de sua mãe, sogra minha, como presente de aniversário (aquele aniversário que eu havia esquecido totalmente, e, quando perguntado se eu lembrava que dia era, perguntei se era o “dia do fico”).

       Desconcertado, ao ser encarado com a realidade, eu quis disfarçar e comentei, com a maior “cara-de-pau” que me foi possível que aquele cãozinho teria “a cara do meu sogro”, com aquele focinho chato e sempre úmido, aqueles olhinhos cheios de remela e aquele latidinho fino e irritante. Minha sogra caiu na gargalhada aprovando, mas minha esposa ditou as regras de como o “Emílio” seria tratado, o que e quando comeria, passeios, onde dormir, tipo de casinha que eu deveria comprar para ele, etc. etc. ...

       Não dava para brigar, mas eu lancei o meu protesto mais veemente, o dedo em riste, subindo e descendo, na ponta do nariz da minha esposa. Ela que arrumasse outro nome para o cachorro, mas Emílio, nunca! Aquele era o nome do meu pai e eu nunca chamaria o cãozinho por aquele nome.

       Gritamos a mais não poder. Ameacei cancelar as férias da família, o que só veio piorar as coisas, pois aí, minha filhinha de dezessete anos, até então indiferente, acostumada àquelas cenas, começou a fazer coro com sua mãe, contra mim, é lógico, enquanto o meu filho caçula, então com onze aninhos, dava mais uma das suas gostosas gargalhadas, como sempre fazia quando não sabia o que estava acontecendo.

       No final eu tive que calar, pois até o meu sogro acordou, ele que, naquele dia como em todos os outros, de festa ou velório, seu time ganhasse ou perdesse, fosse o que fosse, ou como fosse, roncava na rede, bêbado, logo após o almoço, e tendo acordando, mesmo não sabendo do que se tratava, começou a dizer que sua esposa tinha toda a razão e que “nenhum filho de Deus” conseguiria descansar com um barulho daqueles.

       Peguei o boné e saí. Andei bastante e quando cansei, entrei no cinema, no shopping, onde dormi por duas sessões seguidas e fui acordado pelo lanterninha, que exigia que eu pagasse novo ingresso ou fosse “dormir num hotel”. Meu sogro tinha a razão; Nada pior do que ser acordado para a realidade da vida.

       Hoje, meses depois, lá ia eu, àquela hora, levar o “Duque” a passeio (Duque era o nome que eu dei ao cachorrinho, fingindo não perceber que os outros membros da família o chamavam mesmo de Emílio).

       Apesar do inconveniente de ter de levantar cedo, esta era a melhor hora, pois após as oito da manhã, os simples mortais levavam seus cães de estimação para o passeio, e eu sentia vergonha de ter um cachorro tão irritante e insignificante, que, não sei por quê cargas d’água, cismava de latir e avançar sobre os cães que tinham, no mínimo, umas dez vezes o seu tamanho e peso. Àquela hora, com pouquíssima gente na rua, eu me sentia mais à vontade para, inclusive, ensaiar uma “conversa” com o cachorro, que, a essa altura, já me considerava um amigo.

       Eu estava até contando ao “Duque” os passeios que havíamos feito durante as férias (como sempre, prevalecera a vontade da família) “inesquecíveis” para minha mulher e meus filhos, e das quais eu me lembraria ainda por um bom tempo, até terminar de pagar o financiamento.

       Contei da última noite que passei naquele hotel da Barra e da encrenca que arrumei quando, num gesto impensado, fui beijar a minha mulher...

       Eu vinha da praia, onde tinha ido levar meus filhos e, chegando à recepção, vi minha esposa ajeitando o batom, olhando sua caixinha de maquiagem. Pensei em como aqueles últimos dias nos haviam aproximado, e como era bom passar-mos uns dias em “território neutro”, em como ela parecia mais linda naquele vestido azul, que eu ainda não tinha visto.

       Cheguei devagarinho, por traz e, como nos tempos de namoro, beijei o seu pescoço, logo abaixo da orelha. Aquilo sempre dera resultado, eu nem precisaria esperar muito...

...Ploft!, minha orelha ardeu com o tapa, e com os gritos!

       Minha mulher acabava de sair do elevador, a tempo de ver-me beijar a sua “sósia”, que foi quem me deu o tapa, e achou que aquele tapa era só para disfarçar. Começou a gritar, me chamando de infiel, e outras palavras que não convém citar, buscou, num instante as “crianças”, arrumou as malas, fretou um bimotor para levá-la de volta “à casa da mamãe, pois com aquele cretino, nunca mais”, pagando essa viagem com nosso cartão de crédito.

       Fiquei alí ainda por dois dias, tentando me acalmar e esperando que ela se acalmasse,. Depois, levei semanas a convencê-la a voltar para casa, (até prometí “passear com o Emilinho” nos os fins de semana), e ainda vou levar alguns meses para saldar as dívidas.

       A sósia? Ah, meu amigo... Ela ficou com tanta dó de mim, que de vez em quando ainda me telefona...

       (Papai que me perdoe!)

 

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VOLTAR?

Elio R Anderson

 

Você diz que eu prometi voltar, mas...

para quem, para onde, para quê?

 

Já não existe mais a menina,

 

de olhos brilhantes, lábios carnudos,

tão meiga, sincera, amável...

 

A casa também já não existe.

 

Ali, agora, passa uma avenida,

larga, movimentada, tão feia...

 

E o motivo acabou!

 

(hoje, você me olha tão fria...)

 

Talvez nem se lembre que um dia

me prometeu tanto amor.

 

E eu prometi, é verdade, mas

 

(se eu ainda existo, onde está ela?)

 

Como é que eu vou cumprir?

 

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